casa-teatro


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Quarto interior
Circolando
11 de Janeiro, Pequeno Auditório do CCB, sala cheia

Direcção e concepção plástica: André Braga Dramaturgia: Cláudia Figueiredo Composição musical: Alfredo Teixeira Interpretação: André Braga e João Vladimiro Desenho de luz: Cristóvão Cunha Desenho de som: Harald Kuhlmann Co-Produção: Circolando/ Teatro Nacional São João / Centro Cultural de Belém


Na linha de uma programação que tem vindo a divulgar e legitimar o Novo Circo como género das artes do espectáculo, o CCB acolheu o último espectáculo da Circolando, Quarto Interior. O espectáculo é a primeira parte de um ciclo denominado Ciclo Poético da Casa, que terá continuidade no projecto Casa-Abrigo e no espectáculo Mansarda.

Podemos abordar o espectáculo pelo seu título: Quarto remete para um movimento implosivo a que a companhia procede ao entrar na casa-teatro, abandonando a rua que envolvera os primeiros espectáculos. Cavaterra (2006), sobre o trabalho mineiro, foi o primeiro espectáculo a habitar o palco e aí a caixa negra tornava-se, ela própria, o espaço da profundidade negra das minas. Em Quarto interior, pelo contrário, é o exterior que é interiorizado no teatro: a árvore despida que cresce sobre um soalho de tábuas corridas (o chão da rua que é o da casa, um palco sobre o palco); a casa feita de portadas com janelas (as portas como passagem do corpo, as janelas como passagem do olhar, entre interior e exterior); a casa que se abre para revelar o lado de dentro; a figuração do ciclo natural de uma ave, um animal selvagem. Mas não é o exterior que invade este quarto, pelo contrário, é o espaço interior que se desdobra em visões, em sonhos. Deste modo, a Circolando entra em casa, na casa-teatro, para encenar o princípio da criação, o momento visionário, obrigando a própria casa a ceder, a abrir. O Quarto é o ponto de onde se vê e será preciso entrar para que se veja daí o teatro.

Por outro lado, é o interior que modula o espectáculo, e é por ele que o espectáculo acaba por atravessar as fronteiras – já de si ténues – do que se identificou por Novo Circo. A Circolando tem no currículo um espectáculo notável, Giroflé, onde se conseguia o pleno de articular uma ideia de novo circo com teatro de imagens, marionetas e dança, música e cenografia, num espectáculo de rua absolutamente hipnótico. Não querendo reduzir aqui os espectáculos precedentes e consequentes a um ponto de excepção, importa situar o trabalho da companhia como uma das mais férteis abordagens transdisciplinares das artes do espectáculo em Portugal, e em continuidade. Mas essa criação diagonal começa por ter como referencial o Novo Circo. Veja-se, por exemplo, a distância referencial que dista entre Caixa Insólita (2000) e este Quarto Interior. O circo (o malabarismo, o equilibrismo, o gag) aparece a espaços, timidamente, como por obrigação, e mesmo o teatro de imagens (ou as imagens que são teatros) não se chega a instalar completamente. Em vez disso, o que o espectáculo parece explorar bem é uma instalação plástica poética e sugestiva, que estabelece contrapontos simples e eficazes entre exterior e interior e entre distância e a altura. Por outro lado, é a dança que se impõe como movimento deste interior. Desta vez, é o movimento que importa. Mas o espectáculo fica comprometido neste impasse, acabando por nem explorar as sequências ao ponto em que a proeza se transforma em poesia, nem arriscando um passo afirmativo na dança que se adivinha e por vezes aparece liberta. O melhor de Quarto interior fica na continuidade do trabalho de uma das melhores jovens companhias portuguesas e pode também tornar-se o espectáculo em que a Circolando entrou no teatro, ou o circo ficou na rua.











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