Síntese Granular


Síntese granular

Sand Table, Damaged Goods, 15 Outubro, Centro Cultural de Belém


O areal da praia é aquele chão instável e movediço que nem é terra nem mar. Onde não se caminha em frente, mas de lado. A areia é onde os corpos se afundam.
Serve a introdução para apresentar Sand Table, de regresso a Portugal depois de apresentado no C.C.B., em 2005, no âmbito do Festival Temps d’Images. Aí, os espectadores assistiam ao espectáculo num foyer do Grande Auditório, olhando de cima para baixo, como para o fundo de um poço, onde a água se agita em sombras e reflexos. No fundo, existia uma mesa coberta de areia, ladeada por dois intérpretes. A mesa é o palco, o espaço definido da representação, onde se projectam imagens sobre a superfície da areia, imagens de bailarinos a dançar sobre o chão. A imagem vídeo, plana, ganha volume nos contornos da areia. Os intérpretes movimentam a areia sobre a mesa, procurando acompanhar os movimentos dos corpos dos bailarinos. Daí resulta uma subtil sensação de presença física dos corpos projectados e uma intensa dinâmica entre o movimento das imagens e dos manipuladores.

Um primeiro nível de diálogo estabelece-se entre os materiais, o vídeo e a areia, ambos materiais fragmentados mas dos quais resulta uma nova presença, volúvel e ambígua. As imagens tornam-se corpos granulares e a dissociação entre a imagem do corpo e a sua materialidade cria interrupções de onde nascem deformações, breves monstros. O segundo nível de diálogo é entre os corpos reais e os corpos granulares. Qual o estatuto destes corpos reais, intérpretes ou manipuladores? Aqui, a dança, mais que o conteúdo da experiência tecnológica, subsiste ainda como linguagem, e é enquanto diálogo de movimentos que podemos entender a relação de manipulação, como jogo. O momento em que o rosto do intérprete projectado na areia se vai desfazendo é especialmente emblemática, apontando para uma tensão e uma ambiência obsessiva, própria dos trabalhos de Meg Stuart e que aqui é exercitada através das relações entre corpos, não entre personagens, mas na relação entre corpos fátuos e os seus manipuladores.












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